Al Tejo continua a
homenagear a memória do Vicente Roma.
Depois de lhe
transcrevermos = O USUFRUTO DE UM CASTELO POR UMA POPULAÇÃO – O CASO DO CASTELO
DO ALANDROAL E DA VILA DO ALANDROAL – inserido no Livro Castelo do Alandroal
VII Séculos, (e que a partir de agora pode ler na integra no Blogue AL SUL
- http://alsul.blogspot.pt/ – vamos
passar a transcrever: O CASTELO DO ALANDROAL E DOIS ALCAIDES CANTADOS NOS
LUSÍADAS
A importância
conferida por Fernão Lopes na Crónica D. João I a Pêro Rodrigues, o Alcaide do
Alandroal com papel decisivo na Crise de 1383/85
Chico Manuel
O
Castelo do Alandroal e dois Alcaides cantados nos Lusíadas
A importância
conferida por Fernão Lopes, na crónica D. João I a Pêro Rodrigues, o Alcaide do Alandroal com papel
decisivo na crise de 1383/85
O cronista Fernão Lopes, na sua famosíssima Crónica de D.
João I, cita tantas vezes o Alandroal que o historiador José Hermano Saraiva
diz, num pequeno estudo que antecede uma das edições da obra que «depois de
Lisboa, é o Alandroal, uma obscura vila do Alentejo, que mais vezes é
referida». À parte as adjectivações, não deixa de ser sintomática a
constatação.
Tem um honroso lugar de destaque na Crónica, Pêro Rodrigues,
Alcaide do Castelo de Alandroal por altura da crise de 1383-85: Nove capítulos
precisamente do 97 ao 105, referem as vicissitudes porque passa o alcaide e a
população, os ataques de Castela, as traições dos vizinhos, a solidariedade de
e para com os amigos, a sua indefectível lealdade para com o Mestre de Aviz e o
Condestável Nuno Álvares Pereira por entre as tergiversações de outros.
O Alcaide nunca os desilude ainda que arriscando a vida, a
sua chefia, isto é, não decide sem ouviras opiniões dos seus capitães que
chefia, mas assume a total responsabilidade pelas decisões que toma. É aquilo
que hoje se chama líder democrático, sendo certo que também era carismático,
atributos nem sempre fáceis de encontrar nos líderes de ontem e de hoje,
É justo na repartição dos despojos e desapegado em relação
aos quinhões que lhe cabe como comandante, prescindindo dele e repartindo-o
pelos mais necessitados ou anteriormente prejudicados de modo a ressarci-los. É
estratega brilhante que inspira e faz inspirar confiança a D. João. A Nuno Álvares, aos seus
conterrâneos e aos vizinhos e põe em rspeito o inimigo porque, no Alandroal,
apesar de apenas armados com estevas aguçadas – todos aqueles a quem não era
possível distribuir verdadeiras armas , - tanto
corriam os de pé como os de cavalo . Gere com parcimónia mas com sabedoria
os escassos recursos humanos e materiais de que dispõe (a escassez de meios é
evidente se comparada, por exemplo com as possibilidades de Vila Viçosa e de
Olivença).
A relevância dada por
Luís de Camões n´Os Lusíadas a Pêro Rodrigues
Como é sabido, a Crónica de D. João I de Fernão Lopes serve de fonte para os
Lusíadas de Luís de Camões. Este dá grande relevo a Pêro Rodrigues e ao
Alandroal, cantando a valentia, a esteoutro capitão de pouca gente , dedicando-lhe
na totalidade , a estância 33 do Canto VIII do seu Poema Épico, cujo último
verso diz; Pêro Rodrigues é do Landroal.
Na mesma guerra vê que
presas ganha
Estoutro capitão de
pouca gente;
Comendadores vence e o
gado apanha
Que levavam roubado
ousadamente.
Outra vez vê que a
lança em sangue banha
Destes, só por livrar,
co amor ardente,
O preso por amigo, o
preso por leal;
Pêro Rodrigues é do
Landroal.
Os Lusíadas, canto VIII,
estancia 33
Mais tarde, outro Alcaide
deixará o seu nome indelevelmente ligado à História pátria, não tanto pelos
feitos aqui feitos - os tempos eram outros, não já de defesa do solo pátrio mas
de alargamento do império – mas pelos desenrolados em terras do longínquo
Oriente onde nos perdemos e nos achámos. De seu nome Diogo Lopes de Sequeira,
na senda de Lopo Soares de Albergaria, a quem sucedeu, e de outros, este
Governador da índia, o quarto, tal como o seu antecessor, alcaide do Alandroal,
Pêro Rodrigues, arremete contra inimigos, não já de Castela, nem já para
defender o solo pátrio ou a independência, mas para
alargar a fé e o império em terras da Ásia, de Goa até Malaca.
Camões não esquece no seu
poema épico:
Também Sequeira, as ondas Eritreias
Dividindo, abrirá novo caminho.
Para ti, grande Império, que te arreias
De seres de Candace
e Sabá ninho.
Maçuá com cisternas de águas cheias,
Verá, e o porto Arquico ali vizinho;
E fará descobrir remotas Ilhas,
Que dão ao Mundo novas maravilhas
Os Lusíadas, Canto X, estância
32
Diogo Lopes de Sequeira regressa ao Alandroal e aqui
morre e é sepultado, em campa rasa, na Capela de Nossa Senhora da Conceição,
para a qual traz uma imagem da Virgem, feita na Índia, em tempos muito
venerada, a qual até há pouco tempo integrava as procissões dos Passos e do
Enterro do Senhor nas cerimónias da Semana Santa.
Os nomes de Diogo Lopes de
Sequeira e Pêro Rodrigues integram a toponímica local resistindo à avalanche de
nomes sonantes da Primeira Republica que destronaram nomes ilustres da
História.
O mesmo acontece com D. Nuno
Álvares Pereira que dá o seu nome a uma das tais ruazinhas que escorrega do
Castelo para as baixas da vila. Mas o mesmo já não acontece com D. João I, O
Mestre de Aviz, que teve nome de Rua até há duas dezenas de anos e que a Câmara
Municipal do Alandroal entendeu substituir pelo de um médico ilustre desta
terra, de seu nome Manuel Viana Xavier Rodrigues, sem que ao menos mantivesse a
referência ou lhe t ao nome antigo ou lhe tivesse encontrado outro espaço
merecedor. Não estando em causa a justeza da homenagem ao médico e
impulsionador dos estudos pós-primários no Alandroal, está bem de ver, trata-se
de uma lacuna que facilmente se resolverá, estou certo disso, mas é preciso
lembrá-lo aqui e agora, tanto mais que o Castelo do Alandroal pertenceu à ordem
de Aviz.
Uma revisão da toponímia que
é urgente fazer no Alandroal deverá equacionar estes e outros aspectos da
História, identificadores de identidades culturais locais e ilustradores também
para quem nos visita, sobretudo numa altura de incremento da fileira de turismo
que o Alandroal pode oferecer.
Ainda a este propósito bem
parecia, e à História far-se-ia justiça, que o nome de D. Dinis, o nosso Rei
Lavrador, que o Castelo mandou construir, figurasse em artéria condigna do burgo.
Voltando ainda aos dois
Alcaides que nos tem ocupado, registe-se com agrado que o antigo Externato do
Alandroal, escola de ensino particular que desapareceu naturalmente com o
advento do ensino oficial a nível
pós-primário, já depois de 25 de Abril de 1974, tinha o nome de
Externato Diogo Lopes de Sequeira e que tal nome transitou para o do Patrono da
Escola Oficial, neste momento existente, por proposta de antigos alunos daquele
colégio.
Quanto ao nome de Pêro
Rodrigues, foi título de um jornal local que, não obstante ter deixado de ser
editado no Alandroal porque o seu proprietário, editor e director se mudou para
Évora, não perdeu contudo o nome, enquanto se editou em Évora.
Também um clube de Futebol
existiu no Alandroal que adoptou o nome de Pêro Rodrigues.
Se tudo isto se refere, é para
sublinhar a tal ligação umbilical das gentes com história pátria e local que,
bem entendido, nem todos os Alandroalenses – diria até só muito poucos –
conhecerão.
Com efeito, teria que ser
sobretudo a escola a trazer à luz este passado submerso.
À guisa de conclusão e um atrevimento prospectivo
A perspectiva subjacente a
esta comunicação foge ao escopo histórico. Não sendo o seu responsável
historiador, mas sin sociólogo, ainda assim teve o atrevimento de corresponder
positivamente a um convite de colaboração na série de comunicações em boa hora
promovida pela Junta de Freguesia de Alandroal e pela Câmara Municipal de
Alandroal, sob o pretexto das comemorações do sétimo centenário da edificação
do Castelo da vila do Alandroal.
Desde logo assistiu-nos o
entendimento de que quaisquer comemorações da existência de um castelo não se
esgotariam no seu enquadramento histórico, ainda que rica fosse a sua história,
e a todos os títulos merecedora fosse de adequada investigação, divulgação e
até vulgarização,
Os castelos são - ou deveriam
ser – elementos do património edificado vivenciado e não temporalmente
cristalizado: Isto é, os castelos deveriam ser um local de culto e de cultos e
não um comum amontoado de pedras
intocável que apenas nos dizem que por ali passou história, sem se saber
qual, mas não nos mostram a
(con)vivência das gentes que, ex ante, foram
a razão de ser da sua edificação e, ex
post, o seu sustentáculo vivo.
Há castelos que existem por si
com o deserto à volta. Há castelos que coexistem com a sua verdadeira razão de
ser: a população que sempre os amparou e se manteve sob a sua proteção tutelar.
O caso do Castelo Do
Alandroal é paradigmático no que diz respeito à simbiose população-castelo ou,
se quisermos – e não se entenda isto como um mero jogo de palavras castelo-
população. E porquê? Porque não sendo, não tendo sido, a vila do Alandroal uma
vila acastelada, no sentido de que a sua população estaria concentrada adentro
do acastelamento, o Alandroal é sem dúvida, o exemplo perfeito de um aglomerado
populacional envolvente de uma fortificação que perdendo embora, como todas, a
função estratégica de defesa militar tout
court
Terá ganho a função
estratégica, também ela, de manutenção
populacional de uma comunidade.
Parece-nos que este aspecto é
singularmente importante. Pelo menos durante sete séculos uma população viveu
aqui neste lugar, sem altos e baixos demográficos significativos em termos
relativos. Quer isto dizer que a evolução demográfica da vila do Alandroal
acompanhou a evolução registada no meio, apenas sofrendo os traumatismos,
positivos e negativos que outras povoações também sofriam e não qualquer efeito
positivo ou negativo peculiar.
O que distingue a vila do
Alandroal e é objecto de interesse, é que, situando-se nos limites mínimos, ao
contrário do que seria de esperar, soube mantê-los, não perdendo importância
administrativa, consolidando a importância económica, sem grandes
desenvolvimentos, é certo - mas também
nunca os teve – e preservando a idiossincrasia cultural que é sua, tendo sabido
compreender o que se passa para lá dos seus limites de vila, entendendo as peculiaridades
do concelho de que é capital, sem atitudes auto ou heterofágicas, mau grado as influencias sempre exercidas
pelos concelhos limítrofes que tendem a esmagar a economia, a visibilidade e a
notoriedade da vila e do concelho de Alandroal
O que é que isto tem a ver
com o Castelo? Provavelmente nada. O que muito modestamente se pretende revelar
é que a ordem natural das coisas teria remetido o Alandroal para o seio das
micropulações, hoje deificadas, com o seu castelo feitiche- mas nem
isso por isso deixando de ser cristalizadas, económica, social e
culturalmente – que, se nos é permitida a citação, hoje muito conhecida através de Herman José, não passam de vilas
com seu castelo altaneiro. Esta não.
A oportunidade para discorrer
sobre o Castelo do Alandroal no ano em que comemora os sete séculos, ademais
numa perspectiva não histórica ou, se quisermos numa perspectiva não
predominante histórica, remete-nos, quer queiramos quer não, para análise sobre
o status quo
actual no que ao castelo diz
respeito e, por extensão, ao Alandroal, vila e concelho.
Apenas uma simples reflexão
susceptível de induzir análises prospectivas que inexoravelmente terão que ser
feitas a breve trecho, sob pena de se perderem oportunidades como se têm vindo a
perder.
O concelho do Alandroal tem
três vilas cada uma com seu castelo: Alandroal, Terena e Juromenha. Aqui há
alguns anos, tive oportunidade de propor informalmente à Câmara Municipal uma
espécie de slogan promocional para a
vertente histórica que seria precisamente este: Alandroal – Um Concelho, três
Castelos.
Tenho verificado que continua
a ser adaptado, com alguma timidez, é certo, e que a ideia tem pernas para
andar,
Haveria que proceder a estratégias
consistentes, sistemáticas e oportunas no sentido de conseguir dar maior
visibilidade e notoriedade ao concelho do Alandroal.
Este aspecto, para lá de
atrair atenções do exterior, contribuiria para dar mais consistência a
estratégias de coesão interna dos alandroalenses, lato sensu, isto é, dos que
habitam a vila e o concelho. Considero este aspecto muito importante: os
alandroalenses têm que sentir orgulho da sua terra e acreditarem em si próprios. Talvez o grande
mérito do conhecimento do passado e o aproveitamento dos seus vestígios
materiais e espirituais seja o de contribuir exactamente para isso. Todavia,
nada se fará sem o respeito pelo que existe. E neste aspecto muito haveria que
dizer sobre a incúria dos homens com responsabilidades, ao longo dos anos,
nesta to que ser discutidas –: não é aqui nem agora o momento para o fazer. É
apenas o momento – porque o tempo urge – de lançar o repto para uma futura
discussão – porque estas coisas têm mesmo que ser discutidas – sobre as
inadiáveis tarefas que é urgente levar a cabo no sentido de. Primeiro: preservar,
com esmero, o que se tem: segundo: potenciar, com inteligência, o património, o
edificado e o outro, aquele que não se vê e que menos resiste à erosão da
ignorância, mas no fundo o mais importante, e que mais depressa e mais
facilmente, se perde numa sociedade mediatizada e num mundo globalizado que
tende para as unificações de novas culturas emergentes, com impactos negativos
na idiossincrasias próprias; terceiro: associar tudo isto ao crescimento
económico e ao desenvolvimento sócio cultural endógenos.
A grande virtude do Alandroal, se me é permitida esta
análise, resulta não tanto do que tem sido feito ao longo de séculos, mas,
paradoxalmente, do que não tem sido feito. É neste marasmo de dolce far niente que tem vindo a
conservar uma vila que corre o grave
risco de ser apenas pitoresca. Durante anos pouco se fez, daí que não se tenham
cometido muitas asneiras. No último quarto de século, as mudanças aceleradas
que têm caracterizado a sociedade portuguesa, não tendo os impactos negativos
por acção que se verificam noutros sítios têm tido repercussões negativas por
omissão. Pouco ou nada se tem feito para dignificar o património, em particular
o Castelo, no fundo e centro da razão de ser desta conversa e, obviamente, a
envolvente arquitectónica e urbanista..
Os alandroalenses, todos, mas em particular as entidades,
têm obrigação de não só não delapidar ou não permitir que se delapide, a
herança cultural, mas sobretudo, de legar às gerações vindouras a valorização
do que receberam, já que elas, quer queiramos quer não, a todos julgarão.
Talvez a grande referencia, ainda e sempre seja um simples Castelo mais a
comunidade que o envolve.
Vicente Roma
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